– Mariana, você precisa agir de uma maneira mais madura, não se pode ter tudo na vida.
Essa frase dita assim, hoje, no aeroporto, me lembrou um episódio de uns três anos atrás num bar na Amaralina. O pessoal reunido lá e um amigo do amigo me contando sobre o período que ele passou na Europa. O cara ganhou dos pais uma viagem de 15 dias na França. Chegando lá, gostou tanto do lugar que resolveu esticar o passeio por três meses. Simples assim. O orçamento previsto, é claro, apertou. E ele contando: “Foi um período muito difícil na minha vida. Passei fome. Havia dias em que nem dava para almoçar, eu tinha que comer tostas!”, dizia ele narrando uma saga dura e comovente enquanto eu continuava ali, ouvindo, com o passe de ônibus no bolso, a mesma lata de refrigerante na mão a noite inteira, olhando pra ele e imaginando o cidadão na França, sozinho, sofrendo, tolido de entrar nos restaurantes de Paris, obrigado a frequentar os cafés às margens do rio Sena para conseguir almoçar. Coitado.
Nem sei por que lembrei do caso do mauricinho das tostas, mas a conversa desta tarde girava sobre esse tema: insatisfação. E o interlocutor em questão hoje era… eh… minha mãe. Então a coisa era séria. Por que mães costumam ser criaturas especialmente otimistas quanto às deficiências e potencialidades das suas crias, inclusive quanto às potencialidades inexistentes. O filho vai mal na escola? Não é por que o menino é burro, é por que o professor é ruim, o livro didático não presta, o método de ensino não está adequado. A figura não pára num emprego? Não é irresponsabilidade, a culpa é da crise, do patrão explorador, do colega invejoso. O cara mentiu, roubou, matou? A culpa é das más companhias, desses garotos perdidos que andam por aí desencaminhando os meninos de família. Entende? Os garotos perdidos são os outros, os que não têm mãe. (E a que se deve o crescimento exponencial do número de gente burra, irresponsável e perdida no mundo? Ao uso de chocadeiras elétricas, suponho). Mas, o que eu quero dizer é que, bem, no momento em que a sua progenitora conclui que o seu comportamento não está sendo adequado, provavelmente é por que você já ultrapassou todos os limites do socialmente aceitável e está capotando sobre o terreno do absurdo há muitos e muitos quilômetros. É uma espécie de alarme de incêndio depois do incêndio: mesmo que você aja imediatamente após o sinal, já vai ser meio tarde. Roma já estará virando fumaça há séculos.
Daí, hoje, depois dessa frase, eu me senti meio a um passo da camisa de força e resolvi parar. Chega, né? Chega de ligar pra casa chorando pitangas a cada unha quebrada. Chega de chorar durante o telejornal, de pedir pra voltar, de posar de Scarlett O’Hara que não passará fome nem trocará extensão de chuveiro nunca mais. Eu posso reclamar à vontade, posso falar mal de tudo o que eu quiser, mas não posso querer rasgar os pulsos cada vez que alguma coisa desanda, até por que, no fundo, as coisas nem desandam. As coisas, simplesmente, têm um preço.
É isso. Às vezes a gente esquece que a nossa tosta nem foi fruto de uma sina irremediável. Que foi uma escolha.
Miséria pouca é bobagem …rs
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Mari ainda não havia comentado por aqui (apesar de adorar visitar de vez em quando!) mas esse texto foi muito legal. Tento me lembrar disso o tempo todo. E desde que descobri esse exercício, minha vida ficou mais fácil 🙂
Um beijo grande e força!
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Mari,
A vida é feita de escolhas e cada escolha implica numa renúncia. Bjs e boas escolhas…
“Ou se tem a chuva e não se tem o sol,
ou se tem o sol e não se tem a chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não se fica no chão,
quem fica no chão, não sobe nos ares….”
Cecília Meirelles
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