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Archive for the ‘gêmea má (maledicências)’ Category

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Eu tenho uma amiga enfermeira. Sempre nos encontramos – eu, ela e o resto da humanidade comentada. E já que somos figuras públicas facilmente identificáveis na multidão, ela costuma evitar a fadiga substituindo o nome dos nossos conhecidos por nomes de remédios ou doenças. (Maledicência é para iniciados, não tentem isso em casa!)

Amigo fake é “Minancora”, colega de trabalho inútil é “Chá de Boldo”, ex-namorado problemático é “Esquizofrenia Tripolar com Aterramento” e assim por diante. A garota é um primor na arte da figura de linguagem. Analogia pura. De emocionar qualquer literato.

– Sabe Limonada Bezerra?
– Sei.
– Chamou para o aniversário de Esquitossomose. Uma reuniãozinha com Buscopan, Cleptomania e Escabin na casa de Vick Vaporub.
– Você foi?
– Fui. Nem queria, mas fui. Lá estavam Diazepam, Xanax, Enfisema, Soro Caseiro e eu, coitada, a única não-fumante do recinto. Tava divertido, tava animado, tava insalubre. Sério. Me senti respirando com uns 30% da capacidade pulmonar, a caminho da fermentação. A qualquer momento ia começar a produzir meu próprio etanol. O que, convenhamos, seria merecidíssimo.
– E aí?
– Aí chegaram os visitantes insólitos. Primeiro chegou Gripe Suína, não entendi nada. Depois Placebo. E, pra finalizar, quando mais nada de estranho poderia acontecer, quem aparece? Quem? Quem??
– Quem???
– E-BO-LA!

Ontem, não nos encontramos pessoalmente e eu fui me atualizar da resenha do dia por telefone mesmo. Contrita, num banco de shopping, com a ligação péssima, fiquei tentando ouvir o relato do outro lado da linha e comentando:

– O que? Hum? Enfisema? Mentira. E Esquistossomose? Disse isso? Meu Deus do céu, o que você vai fazer? (pausa) Sei. Melhor mesmo. Mas que chato, né? Enfisema é terrível mesmo, nem consigo imaginar. (pausa) Transtorno Suicida também? Fala sério. Eu não acredito, não dá pra acreditar numa coisa dessas. (pausa) Ok, a gente se fala. Beijos.

Quando termino a ligação, se aproxima uma freirinha com olhos rasos d’água e segura minha mão:

– Oh, minha filha, tudo isso vai passar. Acredite em Deus e ore muito. Vou rezar por você e por toda a sua família. Fé em Deus, viu, querida?

E vai embora.

Sim. Minha vida é um roteiro de comédia barata. Baratíssima.

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Adoro quando as pessoas usam vocábulos excessivamente educados para sublinhar instintos assassinos implícitos. “O senhor pode sair da frente, POR GENTILEZA?”. Em 100% dos casos, expressões como “por gentileza” poderiam ser facilmente substituídas por palavras de baixo calão sem nenhum prejuízo para o entendimento das frases. “O senhor poderia abaixar o som, SEU MERDA?”. “É possível servir um café com menos açúcar, CARALEO?”. Aliás, não conheço ninguém que use uma expressão tão formal com naturalidade. Se um ser humano te cumprimenta e introduz o diálogo com “por gentileza”, alerta máximo: tire os fones, gire a cadeira e preste muita atenção, por que o cara vai te falar sobre algo querendo dizer uma outra coisa. É cilada. Não vacile.

Pior de tudo: eu não consigo ouvir essa palavra sem me lembrar daquele lunático que pintava os viadutos do Rio de Janeiro com mensagens proféticas e assinava como “Gentileza”. Barbudo, esfarrapado, revoltadíssimo, andando pelas filas da Tiradentes bradando que os descrentes iam ser espetados pelos córneos do capeta, que todo mundo ali era puta-viado-maconheiro e que, se não se convertessem, iam morrer todos com a espada da justiça divina atravessando os miolos. Esse era o Gentileza, sempre gentil. Pregando o amooooor na base da ofensa. Pedagogia válida, ganhou até museu.

Pois bem, esse cara morreu faz uns anos. Na adolescência, sempre passei as férias de verão no Rio de Janeiro e era presença certa nestes circuitos da cidade, mas, infelizmente, nunca tive a oportunidade de cruzar com tal cavalheiro para assombrar a minha juventude. Não sei por quê. Talvez, nas circunstâncias da época, ter um louco bradando que eu era pecadora e iria queimar no fogo do inferno fosse uma sentença meio redundante. Sei lá.

Dois mil séculos se passaram e o Gentileza continuou sendo, pra mim, a personificação da comunicação truncada. A evidência desta capacidade que as pessoas têm de expressar uma coisa desejando exatamente o contrário. O cara fala de amor, esperança, fraternidade e te manda para o inferno no mesmo parágrafo – o que pode ser mais esquizofrênico? Só essa galera que te aborda com o brilho da insanidade no olhar e te pede, com um sorriso doentio e uma voz metálica, pra você não pisar com o pé sujo no tapete, POR GENTILEZA.

Sempre fico tentada a também bancar a esquizofrênica e fazer exatamente o contrário. Só pra poder dizer “Opa, caro senhor, ME DESCULPE” com o mesmo sorriso metálico, insano e educadíssimo. Pagar maluquice com maluquice. Gentileza gera gentileza.

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FDS

– Alô?
– Nana, você estava ontem na festa do Catussaba, não foi?
– Não…
– Tava, sim. É aqui perto, te vi estacionando na porta. Não minta para seu tio.
– Mas eu estava em casa.
– Fique tranquila, eu não vou contar pra ninguém. Mas aquilo é baixo astral demais, Nana, você tem que ter cuidado! É deserto, tem ladrão! Tá bom? E pode confiar em mim. Se cuide. Beijos.
– …

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E, por fim, Kadafi foi morto. Durante todo o ano de 2011, o mundo inteiro acompanhou a saga da Líbia até este desfecho, especialmente ontem, quando todos os jornais publicaram milhares de fotos sobre o evento. Imagens de tanques de guerra, soldados armados, bombas de gás, rebeldes com metralhadoras, tensão e medo. Daí, entre as notícias, havia a foto de um confronto. Uma que mostrava, no meio do tiroteio, entre os destroços e os soldados, um cidadão desarmado. Um civil, muito apaziguado, tocando um violão. Tipo assim, UM VIOLÃO.

Um VIOLÃO, meu caros.

Não basta ser autista, tem que tocar um VIOLÃO NO MEIO DA GUERRA. Como não amar? Quando eu vi a foto, só conseguia pensar no que se passava na cabeça do cara – está rolando um tiroteio e eu canto uma canção, a cidade está ardendo em chamas e eu canto uma canção, chove tijolos de enxofre sobre a sucursal do inferno e eu vou compor uma música! – eu realmente desejava perguntar: meu bem, assim…

me. explica. o. seu. objetivo?

Nenhum, suponho. E não me contive. Graduada em gerenciamento de crise, doutora em fazer cara de paisagem ao som das trombetas do apocalipse, obviamente, me apaixonei à primeira vista. Preciso falar com esse cara, gente. Como faz, hein? Caro líbio-suicida, qual o seu nomeee? Qual o telefone do violãozinhoooo? Eu também toco, canto e faço dancinha, querido! Mantenha contato, envie os seus dados, preencha o nosso cadastro. Mande um scrap, um convite para o gtalk! Beijosmeligaaa!

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(Folha On Line, 20/10/2011)

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#19

Ninguém, Charlie, ninguém…

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Meus heróis morreram de overdose.

Oremos.

(Moscou, 20 de setembro de 2011, 10 graus)

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