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Posted in choro baldes (arte), tagged anúncio, louis vuitton, mariana mranda, publicidade on setembro 29, 2014| Leave a Comment »
Posted in raspas e restos (crônicas), tagged budapeste, eleições, hungria, parlamento, publicidade on fevereiro 23, 2014| Leave a Comment »
Durante muitos anos, o maior ícone da política moderna no planeta foi um edifício da cidade de Budapeste. Era o maior parlamento do mundo. Ficava à beira do Danúbio e era enorme: tinha 700 salas e 27 entradas de puro luxo e ostentação. Hoje, lá também funciona um museu e a peça mais visitada do prédio inteiro é um pedacinho de metal. Um porta-charutos.
Devo acrescentar que o objeto é numerado, fica num canto desimportante e parece meio gasto. Dizem que ele se tornou relevante por que cada senador tinha direito a um número. No intervalo entre as sessões, eles fumavam um pouco na varanda, depois deixavam seus charutos lá, cada um no seu lugar certo, para terminarem de fumar nos dias seguintes. Era uma tradição.
O cargo no parlamento era vitalício e, às vezes, quando um senador falecia, os outros precisavam escolher um substituto para a vaga. Depois da eleição, o novato tomava posse da cadeira e de todas as obrigações da função: as pastas, os livros, os processos, quase tudo era imediato. Só o direito ao uso do porta-charutos era conquistado depois, com o passar dos anos. Quando ele se mostrasse à altura do cargo. Se o eleito honrasse o seu antecessor, demonstrando honestidade e empenho. E isso não acontecia no momento da ascensão. Era a coroação de um resultado.
Até hoje, na Hungria, um momento importante dentro do cenário político é o fim de um mandato. É quando se agitam bandeiras e se fazem discursos e acontecem estas manifestações que, aqui, estão associadas a uma vitória nas eleições. Nos baixos trópicos, pouco falamos sobre políticos em fim de gestão. O balanço de um governo consta basicamente na prestação de contas ao Ministério Público, que nem vale uma nota na imprensa, ocupada com novas pesquisas de intenção de votos. Aqui, sinônimo de aprovação popular é o empoderamento de um sucessor ou uma reeleição. Vivemos uma espécie de banquete sem digestão, de prelúdio sem ópera: no dia em que passam a faixa, homens e mulheres mergulham no anonimato sem nenhum rito de passagem, seja de aprovação ou de repúdio. Não se guarda, ao menos nos arquivos da mídia de massa, nenhuma memória exata sobre o que fizeram. Eles só voltam aos palanques caso embarquem em outra escalada por mais um cargo público – num círculo interminável que vem formando ótimos marketeiros e péssimos gestores. Num país realmente preocupado com resultados, nenhuma preparação seria mais importante do que o desfecho.
É certo que os tempos mudaram, que os governos evoluíram, mas talvez a democracia nunca tenha sido tão performática. Na maioria dos países, o período de campanha eleitoral se converteu numa corrida baseada na repetição, na persuasão, no discurso. E é curioso como os eleitores ignoram os índices dos últimos quatro anos, como preferem debater sobre promessas ainda abstratas. Se pensarmos pela lógica húngara, aonde estão os dados? O que temos a dizer sobre os que estão deixando a mesa? Nas últimas décadas, quantos eleitos já tomaram posse no nosso parlamento? Por fim, quantos realmente mereceriam espaço num porta-charutos hipotético por seus resultados?
Provavelmente, não sabemos. Desconhecemos os números. Mas sabemos qual é o slogan e qual o jingle do próximo candidato. Em 2014, voltaremos todos às urnas, cheios de fé e esperança num país melhor e mais justo. Que vença, outra vez, o melhor publicitário.
(Budapeste, 09 de julho de 2009)
Artigo publicado no Jornal Público, de Portugal. Confira aqui.
Posted in raspas e restos (crônicas), tagged firma, publicidade, trabalho on novembro 4, 2010| 3 Comments »
Hoje eu sonhei com o tempo em que eu trabalhava na agência. Faz tempo. Naquela época, eu tinha uma mesa, uma cadeira, um computador, um salário fixo no fim do mês e anúncios, muitos anúncios para fazer. No começo, eu nem entendia nada daquilo, era menor de idade, eu só queria dinheiro pra ir à praia, gostava de ver meus títulos publicados no jornal, queria diversão. E era divertido.
Depois de sete anos de redação, o ruído do elevador do escritório me causava náusea. Eu odiava tudo aquilo. A porta abrindo, as pessoas entrando, apertando o nono andar e falando de seus carros e vinhos e barcos, por que ninguém fala dos próprios fracassos no elevador da firma. Os mídias com seus crachás no bolso, os produtores com suas piadas fáceis, as moças de atendimento com aquelas calças de terninho esmagando bundas altamente profissionais. E eu. Até o nono andar. Uma eternidade.
Depois, entrar no setor e ligar o computador. E deixar lá, ligado, avisando que eu cheguei, por quê computador ligado é o novo cartão de ponto das empresas. Fazer a social, falar do último Cannes, do último lançamento da Mac, dizer que aquele anúncio do concorrente ficou uma bosta. Comparecer à reunião. Mesa de fórmica. Telão na recepção passando show do Asa de Águia, empresários com crises de meia-idade flertando secretárias com crises financeiras. Sono, sono. E eu pensando: um dia, eu vou embora daqui. Hora do almoço, grupinhos de terno debaixo do sol decidindo o melhor restaurante de comida a quilo: “podem se servir que, hoje, quem paga é o Fernandes”, “nada disso, quem paga é o Almeida”. Aniversariante do mês, champanhe nacional em copo plástico, fatia de bolo no guardanapo. A gente se encontra na premiação, ok? Cambalear no salto alto em cima do tablado, agradecer no microfone ao patrocinador e estender o troféu ao lado do cliente. Bêbado. Trofeuzinho na mesa, tapinha nas costas, meu Deus, um dia eu largo essa merda.
Às vezes, mudar de agência. Três vezes. Quatro. E me sentir no mesmo lugar. Sempre a única mulher do setor de criação, dez homens, onze cadeiras. No começo eles te excluem. Depois, te espionam. Depois, te adotam, te abraçam o tempo todo e te chamam de brother. Briga de sócios na sala do lado, briga de colegas pela vaga do estacionamento, comentário maldoso, hora extra, cafezinho em garrafa térmica, eu gastando toda a minha criatividade-idealista-universitária em anúncios de sabonete. De seguro dentário, de carro esportivo. Frustração. Bocejo. Solidão. Aumento o volume no: in a sky full of people, only some want to fly, is not that crazy, crasy, crasy?, levanto da cadeira, afasto as persianas da janela e olho o mundo atrás da vidraça, céus, eu quero fazer outra coisa. Mas como?
Aí, um dia, acontece. Não assim, de repente, mas acontece. E eu me vejo em outro lugar, fazendo outra coisa, sem o ruído do elevador do escritório. Sem o escritório. Sem mesa de fórmica, sem crachá, sem garrafa térmica. Fazendo muitas outras coisas que, mesmo mais toscas e simples e mal remuneradas, me matam de fome, mas não me matam de tédio. E descubro que elas são duras. Mesmo. Por que entregar jornal na chuva é duro. Por que trabalhar de madrugada é duro. Por que ficar oito horas por dia em pé num balcão é duro, é desumano, é um absurdo. E eu nem imaginava o quanto. Daí, quando chego em casa, eu tiro os sapatos emporcalhados e me jogo no colchão, eu nem penso nisso. Eu durmo pesado, exausta, quase sempre. Mas, hoje, eu sonhei. E sonhei com essas coisas. Com esse tempo. Com a época em que eu tinha uma mesa, uma cadeira, um computador. De quando eu tinha um salário fixo no final do mês. Reuniões, festinha, premiação, tapinha nas costas. Estatuetas ao lado do desktop. Bolo de aniversário no guardanapo, anúncio meu publicado no jornal, essas coisas. De todo o conforto e segurança e rotina ajustada que eu tinha na época em que eu trabalhava para a agência.
E acordei assustada.
– Calma, calma. Foi só um pesadelo.