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Posts Tagged ‘delicate’

Saiu um artigo na Obvious sobre a tristeza. Narrava um cenário hipotético, um encontro de compositores famosos. Sozinhos com seus violões, num silêncio angustiado, “seus olhos abatidos seguindo um amor pedido pela sala”. Num canto, o Damien Rice dedilhando Delicate ou The Blower’s Daughter. Ao longe, as sombras de Jeff Buckley e Bob Dylan. O Smith escrevendo num guardanapo: “Mantenha-se à parte, no fundo do meu coração, separado do resto, onde eu te guardo melhor, onde eu manterei as coisas que você esqueceu”. As taças na mesa, a janela aberta: tantos artistas de coração partido. O que a arte procura quando insiste em vasculhar o fundo do poço?

O artigo não fala sobre isso, mas eu tinha vontade de perguntar: quando se é jovem, genial e reconhecido, o que ainda pode faltar? As biografias são transtornadas. Penso que aquelas celebridades poderiam escrever sobre o que bem entedessem, mas focam exatamente no que não está lá: uma pessoa, um lugar, um afeto. Uma ovelha que escapa e parece ofuscar todo o rebanho. O que é que ainda dói quando se tem quase tudo?

Pior: nunca entendi quem é exatamente o público-alvo deste tipo de música. Quando Someone Like You ficou em primeiro lugar como a canção mais ouvida de 2012, eu olhava com desconfiança para as redes sociais esbanjando vidas eufóricas 24/7. Se todos acumulavam conquistas + amigos + sucessos profissionais, aonde estavam os ouvintes de Adele? Aonde estavam os losers amargurados que consagraram No Surprise? Os rejeitados que ovacionaram Creep? Eles não existem. Ou são as projeções publicadas da internet que não existem.

“Ninguém disse que seria fácil, ninguém disse que seria tão difícil”. A gente poderia incluir naquela sala de estar hipotética o Leonard Cohen e a Edith Piaf. Convidaríamos o Kurt Cobain para a mesa, o semblante perdido da Billie Holiday, o andar sonâmbulo da Amy pelos corredores. Neste jantar utópico, cada um poderia cantar um pouco a sua própria dor e “deixar a garrafa escorregar por entre os dedos, quebrando-se como uma promessa feita”. Os vizinhos aplaudiriam, emocionados. E fariam fila para se jogar do último andar.

A verdade é que a conta não fecha: sempre que outro hino à melancolia faz sucesso, eu fico procurando pelo público-alvo. Talvez a vida dos outros nunca seja o que se pensou. Nos resta aumentar o volume, girar o botão do rádio como se fosse o do gás – o que nos falta domina a nossa vida.

Qual foi a ovelha que te escapou?

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