Ouso dizer que não é um grande livro (se você abandonar este blog a partir daqui, eu vou compreender), mas que vale dois ou três grifos e uma consideração sobre os protagonistas idosos de García Márquez: sempre sinuosos, sarcásticos, não valem naaaaada.
“Nunca fiz nada diferente de escrever, mas não tenho vocação nem virtude de narrador, ignoro por completo as leis da composição dramática e se embarquei nessa missão é por que confio na luz do muito que li pela vida afora. Dito às claras e às secas, sou da raça sem méritos nem brilhos, que não teria nada a legar aos seus sobreviventes se não fossem os fatos que me proponho a narrar do jeito que conseguir nesta memória do meu grande amor.” (pág. 11)
“É um triunfo da vida que a memória dos velhos se perca para as coisas que não são essenciais, mas raras vezes falhe para as que de verdade lhe interessam. Cícero ilustrou isso de uma penada: não há ancião que esqueça onde escondeu o seu tesouro.” (pág. 14)
“Passei uma semana inteira sem tirar o macacão de mecânico nem de dia em de noite, sem tomar banho, sem fazer a barba, sem escovar os dentes, por que o amor me mostrou tarde demais que a gente se arruma para alguém, se veste e se perfuma para alguém, e eu nunca tinha tido para quem. (…) Então compreendi até que ponto o sofrimento tinha me corrompido. Não me reconhecia na minha dor de adolescente. Não tornei a sair de casa para não descuidar do telefone. Escrevia sem desligá-lo e, no primeiro toque, pulava em cima dele pensando que poderia ser Rosa Cabarcas. Interrompia a cada tanto o que estivesse fazendo para ligar para ela, e insisti até compreender que aquele telefone não tinha coração.” (pág. 93-94)
(Memória de Minhas Putas Tristes / Gabriel García Márquez)
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