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Posts Tagged ‘poema’

Você sonhará em comprar flores

Esse ano, num almoço, estava calor e eu sentei numa poltrona perto da janela, derretendo. Fiquei folheando uma coletânea de poemas que reunia uns 60 autores nacionais. Um poema de 1979 me chamou a atenção:


Hoje você vai me pedir em casamento
E vai me achar bonita
cabelos, olhos, sorriso.
Vai, inseguro,
como todo noivo que se preza,
pensar em como será a vida a dois.

Você hoje vai me pedir em casamento
e vai me achar ideal.
Você pensará que será responsável
pela feira, mercado, filhos, família.
E como sobreviver você se preocupará
com nós dois a sós,
somente, sozinhamente, sexualmente,
menos na fragilidade
diante do dia a dia.

(…)

Hoje você vai me pedir em casamento
e sonhar com o meu corpo provisório
sem saber disso.
Vai sonhar com o grande sentimento que nos une
sem saber que ele correrá risco a cada dia.
Você sonhará em comprar flores
sem saber que estas são uma necessidade
são prioridade para manter o sonho do casamento.
Você vai até pensar na grande família que terá
sem antes pensar na pequena família de dois.
Você sonhará com a futura realidade
sem saber que a realidade
precisa ser como um sonho.

(…)

Você vai me pedir em casamento
e pensará no quanto é amado
e ingenuamente dirá:
com isso, pelo menos, eu não preciso me preocupar!
Sem saber o quanto custa
manter um grande amor.

Você hoje vai me pedir em casamento
e ouvirá um entusiasmado “sim” – não duvido
Sem saber que para manter a resposta
é preciso manter o pedido.

.

(Antologia Alvorecer, Pétalas e Lâminas, Org. Carmem Camuso)

Os poemas eram numerados e o nome dos autores ficava num sumário. Dos 60 poemas, eu só procurei a autoria deste. A autora era minha mãe, aos 19 anos, no ano em que noivou com meu pai.

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Do poeta palestino Marwan Makhoul, pela curadoria de Katia Borges

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Falar de amor

como se fala de uma cidade

como se fala de um inseto

que apareceu no meio da noite.

Como se fala

de um sonho

de uma mentira

de um gato preto no telhado

do vizinho

de uma rede de pesca

de uma gota de chuva

do sofá da casa da minha avó.

Falar de amor como se fosse algo casual como contar um dois três cantar parabéns em aniversários dizer saúde depois de um espirro e bom dia depois de acordar e boa noite antes de dormir como se fala oi tudo bem e se responde tudo e como você e se diz quanto tempo passe em casa que saudade vamos nos falando.

Então continuar a falar de amor

como se esse fosse

o único assunto possível.

Por que é.

(Clarissa Sabino / Nada disso é para você)

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Eu

quando olho nos olhos

sei quando uma pessoa

está por dentro

ou está por fora.

Quem está por fora

não segura

um olhar que demora. 

De dentro de meu centro

este poema me olha.

(Paulo Leminski / Caprichos)

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“Raramente penso em ti.
Teu destino pouco me interessa.

Mas de minha alma ainda não se apagou
o brevíssimo encontro que tivemos.

Evito, de propósito, tua casinha vermelha,
tua casinha vermelha junto ao rio lamacento;
mas bem sei com que amargura
perturbo a tua ensolarada quietude.

Embora não te tenhas inclinado sobre mim
suplicando-me que te amasse,
embora não tenhas imortalizado
o meu desejo em versos dourados,
secretamente lanço encantamentos para o futuro,
sempre que as noites são de um azul profundo,
e tenho a premonição de um segundo encontro,
um inevitável segundo encontro contigo.”

.

(da russa Anna Akhmátova, no poema “Raramente Penso em Ti”, de 1913, tradução de Lauro Machado Coelho)

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(Ana Martins Marques / O Livro das Semelhanças)

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“Era um desses dias em que tudo corre bem.

Tinha limpado a casa e escrito 

dois ou três poemas que me agradavam.

Não pedia mais nada.

Então saí pelo corredor para retirar o lixo

e, atrás de mim, com um pé-de-vento,

a porta se fechou.

Fiquei sem chaves e às escuras

sentindo as vozes de meus vizinhos

através de suas portas.

É transitório, disse a mim mesmo;

porém assim também podia ser a morte:

um corredor escuro,

uma porta fechada com a chave para dentro.

O lixo nas mãos.”

.

.

(do poeta argentino Fábián Casas / Sem chaves e às escuras)

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“E ouviria você recitar o poema por dez ou doze vezes. acho que te pediria para recitar durante a noite inteira. a sua voz, você, o poema. já é noite. te peço: recita o poema. daqui eu te escuto. diria-te que tua voz soa como barulho de mar que acalma, mas soaria clichê. digo-te apenas que te escuto, sabes bem que te escuto. a noite até ficou mais bela. posso ver e ouvir você recitar o poema. você, a noite, a voz. te peço: recita o poema.”

(Janiele Marinho / Azul Ausente)

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“Aquele que amo
Disse-me
Que precisa de mim.

Por isso
Cuido de mim
Olho meu caminho
E receio ser morta
Por uma só gota de chuva.”

(Bertolt Brecht / Para Ler de Manhã e à Noite, no livro Poemas 1913 – 1956, pág. 143)

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“Você sabe,
eu sempre tive família e emprego…
Algo sempre esteve no caminho
Mas agora eu vendi minha casa
Achei esse lugar, um estúdio enorme
Você devia ver a luz e o espaço
Pela primeira vez na minha vida…
… vou ter um lugar e tempo para criar.

NÃO, BABY!
Se você vai criar…
… você vai criar,
seja trabalhando 16 horas por dia
numa mina de carvão.

Ou você vai criar
num pequeno quarto com três crianças
enquanto recebe seguro-desemprego.

Você vai criar
com parte da sua mente
e do seu corpo estourados.

E eles não criam nada a não ser
uma vida mais longa pra encontrar desculpas.

(Charles Bukowski /Pedaços de um caderno manchado de vinho)

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